Como ampliar o vocabulário dos jovens na era digital?

Se yatipo e bué são as palavras que o seu filho mais diz, é natural que sinta alguma apreensão e que já se tenha interrogado sobre a forma como poderá contribuir para ampliar e diversificar o seu vocabulário. Quando os adolescentes revelam dificuldade em abandonar o nível de língua que usam entre si e em empregar uma linguagem mais cuidada e formal, a preocupação dos pais é bem justificada, pois a tendência para abusar do calão pode comprometer o desempenho escolar (e, mais tarde, profissional) dos jovens.

O fundamental, enquanto educadores, é estarmos atentos às oportunidades que existem para proporcionar aos jovens a possibilidade de ampliar o seu vocabulário e usar uma linguagem mais formal.

Para que alguém esteja apto a utilizar um registo linguístico cuidado, é preciso que tenha contacto frequente com esse tipo de linguagem. Porém, ler bons livros e ouvir com regularidade o discurso de pessoas que falam com propriedade são práticas cada vez menos populares entre os jovens. A maior parte prefere ocupar o tempo livre em atividades sociais e recreativas que envolvem o uso de pelo menos um ecrã e uma linguagem essencialmente fragmentária, utilitária e informal, portanto insuficiente para aprofundar competências de literacia.

No entanto, é conveniente não generalizarmos em excesso: assim como há jovens que apreciam literatura de boa qualidade, também há conteúdos educativos nas redes sociais, e o uso da tecnologia pode contribuir para apurar o conhecimento linguístico. O fundamental, enquanto educadores, é estarmos atentos às oportunidades que existem para proporcionarmos aos jovens a possibilidade de ampliar o seu vocabulário e usar uma linguagem mais formal, através de boas relações interpessoais e, de preferência, com base nos seus interesses.

Assim, é preciso ter em conta os seguintes princípios:

1. Nem todos os programas que eles veem são linguisticamente pobres

Há vários programas de televisão que podem parecer superficiais, insensatos ou mesmo chocantes, mas que do ponto de vista linguístico têm bastante interesse. Em muitas séries humorísticas, por exemplo, é frequente as personagens utilizarem um registo bastante formal, com vocabulário sofisticado. A finalidade é fazer rir, mas a verdade é que esse vocabulário vai entrando na cabeça dos jovens e pode ser por eles usado em situações de comunicação formal.

2. As conversas mais banais podem ser oportunidades de treino

Há desafios e brincadeiras que se podem introduzir nas conversas do dia a dia para ajudar a diversificar a linguagem. Por exemplo, a família pode jogar à palavra proibida (que pode ser bué, ya ou tipo!), tendo cada um dos participantes de passar um certo tempo (durante a refeição, uma hora, um dia inteiro…) sem pronunciar a palavra que mais costuma dizer. Outro jogo para a família é o dos três sinónimos, segundo o qual cada vez que alguém diz um adjetivo tem de mencionar mais dois com o mesmo significado. E o mais útil e divertido talvez seja o jogo de “Sua Excelência” ou “Vossa Majestade”, em que todos se tratam com deferência, empregando a segunda pessoa do plural (vós).

3. Para poder exigir, dê um bom exemplo

É natural e compreensível que os pais acabem, muitas vezes, por falar da mesma maneira que os filhos, por uma questão de identificação e companheirismo, por serem também eles jovens, por usarem uma linguagem semelhante com os companheiros de trabalho ou por outras razões. Isto significa que talvez tenham de fazer um esforço consciente para elevar o nível de língua que utilizam com os filhos, de modo a servirem de modelo e de fonte de inspiração. Empregar os verbos no modo conjuntivo e no condicional, por exemplo (dizendo “talvez te faça uma surpresa” em vez de “vou-te fazer uma surpresa”, perguntando “onde gostarias de ir?” em vez de “onde é que gostavas de ir?”), usar conjunções típicas da escrita, como pois, porém, todavia, no entanto e contudo, em vez de repetir a palavra mas, e substituir deliberadamente certas palavras por outras que as crianças normalmente desconhecem (“díspar” em vez de “diferente”, “apoquentar" em vez de "preocupar") pode ser uma forma divertida e eficaz favorecer a aprendizagem através da surpresa e da curiosidade.

4. A motivação é o motor mais poderoso da aprendizagem

Ao surpreendermos os nossos filhos com uma linguagem inesperadamente formal, criamos uma maior predisposição para a aprendizagem. Mas a motivação é ainda mais poderosa do que a curiosidade. Quando querem, os nossos filhos aprendem tudo, mesmo aquilo que requer uma capacidade de memória aparentemente extenuante. Portanto, a chave para conseguirmos pô-los a falar bem reside na nossa capacidade para os entusiasmarmos, de modo que eles queiram saber falar bem. Falar-lhes sobre a importância de usar uma linguagem apropriada no meio profissional em que eles desejam trabalhar, por exemplo, pode ser uma forma de os incentivar a ter mais cuidado com a forma como se exprimem.

Cada criança, cada jovem, tem as suas paixões, os seus projetos, os seus desejos, as suas preocupações. Se soubermos quais é que “movem” os nossos filhos, poderemos aproveitá-los como estímulo, por exemplo, para os levar a assistir a documentários, palestras, visitas guiadas, workshops sobre temas do seu interesse. Nessas ocasiões estarão a aprender sobre o que gostam e, simultaneamente, a ser expostos a um registo linguístico cuidado e formal.