Regresso à escola: como ajudar os mais novos a enfrentarem as mudanças?
As transições, como o regresso às aulas, são períodos desafiantes que provocam emoções intensas nas crianças e jovens. Este artigo explora como pais e professores podem apoiar os mais novos durante essas mudanças, ajudando-os a adaptar-se às novas realidades, a fortalecer a autoconfiança e a desenvolver competências emocionais e sociais essenciais para o seu futuro.
Inês Sottomayor | 16-09-2024Quando pensam em regresso às aulas, o que vos vem primeiro à cabeça?
Talvez alguma ansiedade, por tudo o que têm de tratar, comprar e organizar; algum medo, que vos leva a pensar: “será que o meu filho se vai adaptar à nova escola, ao novo ciclo, será que vai fazer amigos?”. Também poderão sentir-se tranquilos: “Ufa, vamos voltar às rotinas; vou descansar no trabalho”.
Acredito que vários pensamentos e sentimentos inundem o vosso espírito. E os nossos filhos, o que será que eles sentem e pensam?
A verdade é que todos os períodos de transição, de mudança, provocam em todos, quer sejamos adultos, crianças ou jovens, um turbilhão emocional e comportamental que nem sempre é fácil de gerir.
Para melhor ajudarmos os nossos filhos, vou recorrer a um conceito desenvolvido por William Bridges, no qual se destaca a diferença entre transição e mudança. Segundo o autor, mudança refere-se ao evento externo, que acontece fora de nós, como, por exemplo, mudar de escola, de turma ou de ciclo, ou seja, é um facto que marca uma nova realidade. Por outro lado, transição é o processo interno e, como tal, subjetivo, que implica a adaptação psicológica à mudança; é um processo que acontece ao longo de um período de ajuste à nova realidade, enquanto a mudança, por norma, é imediata. É nesta transição que nós, pais e professores, temos um papel fundamental, para que esta aconteça da forma mais harmoniosa possível. O mesmo autor refere três estágios na transição.
A verbalização implica a tomada de consciência da situação, e esse é o primeiro passo para enfrentar qualquer mudança.
Ao primeiro, ele denomina Fim. É nesta fase que acontece o reconhecimento da situação; aceitar que algo acabou está relacionado com o desapego do que se conhecia e do que se estava habituado. Pode ser simplesmente aceitar que acabaram as férias e o tempo mais livre, sem rotinas e obrigações. Por vezes, é necessário aceitar que já não vão estar com a sua professora do primeiro ciclo nem com os amigos de sempre, ou ainda aceitar a transição para uma nova etapa de vida, como a adolescência. Nesta fase, podemos ajudá-los a reconhecer o que estão a sentir, o que determinada situação lhes provoca, que pensamentos surgem, e que, de alguma forma, os inquieta e deixa inseguros. A verbalização implica a tomada de consciência da situação, e esse é o primeiro passo para enfrentar qualquer mudança. A nossa predisposição para os ouvir, sem minimizar ou ridicularizar o que sentem, é fundamental para que a mudança seja vista como uma oportunidade de crescimento e fortalecimento, em vez do medo, evitamento ou até fuga perante a mesma. Ou seja, é uma excelente oportunidade para desenvolvermos competências como a autoconfiança, a gestão emocional e a empatia.
Lembrar ainda que cada filho tem o seu próprio tempo de adaptação e que nem todos reagimos da mesma forma à mudança.
A segunda fase é a Zona Neutra. Caracteriza-se por ser um período de incerteza e de alguma confusão. No fundo, é o momento de transição propriamente dito, em que a situação anterior já se perdeu, já não existe, mas o novo, apesar de já ser uma realidade, ainda não se cumpre na totalidade. Exemplo: quando voltamos de férias, e isso é um facto, acabou-se o descanso, mas as rotinas ainda não se estabeleceram por completo. Quando eles mudam de escola e as aulas ainda não começaram, talvez até ainda se encontrem com amigos do ano anterior. A adolescência é o exemplo perfeito desta zona neutra; tanto nos pedem carinho como nos empurram para bem longe. E se este período pode gerar insegurança e alguma ambiguidade, é também um momento potencial para estimularmos a criatividade, o otimismo ou a coragem. O nosso apoio durante esta fase pode ser muito estruturante, na medida em que temos a possibilidade de criar um ambiente seguro onde eles possam explorar os seus sentimentos e experimentar atitudes e comportamentos que os ajudem a ultrapassar a mudança. Lembrar ainda que cada filho tem o seu próprio tempo de adaptação, que nem todos reagimos da mesma forma à mudança, mas que todos temos capacidades para lidar com ela, ajudando os nossos filhos a identificarem as suas forças e competências, que lhes podem ser úteis para ultrapassar esta fase, assim como as ações que queiram concretizar, sendo esse o melhor suporte que lhes podemos dar.
É altura de celebrar, de valorizamos as pequenas conquistas, de lhes mostrarmos o que foram capazes de ultrapassar.
E, por último, temos o Novo Começo, em que se inicia a construção de um novo modo de estar adaptado à mudança que ocorreu, preferencialmente num modo mais evoluído. É a altura em que se abraçam os novos desafios, que passam a ser encarados como oportunidades. Imaginem o momento em que as rotinas já estão estabelecidas, até incluíram novas atividades, vossas e das crianças, estabeleceram objetivos para este novo período e criaram hábitos. Os nossos filhos já fizeram novas amizades, já se sentem à vontade em ir para a escola ou com uma determinada matéria. É altura de celebrar, de valorizamos as pequenas conquistas, de lhes mostrarmos o que foram capazes de ultrapassar, que no meio da incerteza criaram algo melhor, que tiveram esperança no futuro e desenvolverem um pouco mais as suas competências, como a resiliência, flexibilidade e responsabilidade, que foram amplamente trabalhadas em todo este percurso.
No fundo, ajudarmos os nossos filhos a passarem pelo processo de transição de forma flexível e adaptativa, sem se criar resistência à mudança, é um presente que lhes estamos a oferecer para o futuro. Claro que pode ser assustador o início, mas é sem dúvida uma excelente oportunidade para evoluirmos e irmos mais além.
SUGESTÃO DE LEITURA
Apoiar os nossos filhos nas transições ajuda-os a enfrentar desafios com confiança. Ao desenvolverem competências emocionais, preparam-se para o futuro. O livro Aprender a Ser oferece ferramentas práticas que pais e educadores podem usar no dia a dia, promovendo o crescimento emocional e social das crianças.
Aprender a ser
Como desenvolver as capacidades emocionais e sociais dos seus filhos
Numa abordagem muito próxima, e através de vários exercícios práticos e divertidos, a formadora Inês Sottomayor mostra-nos como podemos potenciar as competências dos nossos filhos ao mesmo tempo que trabalhamos – e melhoramos – as nossas dinâmicas familiares.
SABER MAIS>>